Este é tempo de facto e de notícia.
Não ouves o rumor do acontecer ?
A fonte do petróleo (diz-se) vai secar
verás a Europa à luz de uma candeia
verás a giesta e a catedral
a flor e a pedra
a breve eternidade dentro do efémero.
E quem dirá ó Dante
a ordem que termina ?
Talvez um mensageiro chegue ao amanhecer.
Ouvi dizer que os bárbaros estão dentro da cidade
mas ainda há pão e circo
alguns Calígulas
e longas filas de automóveis ao domingo.
Em Stratford-on-Avon o rio corre
e a inflação aumenta na Primavera.
Como cantar sem que o poema seja
uma história narrada por um louco
num palco vazio
para ninguém ?
Em Stratford-on-Avon o rio corre
sobem salmões as águas da Galiza
e num lugar chamado Chãs
em Águeda
as laranjeiras começam a dar flor.
Junto à fronteira em aldeias muito velhas
ainda cheira a pão.
Verás a toalha branca sobre a mesa
um cheiro a linho e hortelã
ou talvez ao bolor que vem das arcas
junto à fronteira em aldeias muito velhas.
Talvez se encontre um espaço para o homem
não propriamente o frigorífico
nem a ilusão de domingo
talvez se encontre ainda um espaço
como um pouco de pão em cima
da toalha branca. Ou talvez a alegria
nos lagares de Setembro.
Repara como Roma se esgota
nas suas hombas
de gasolina. São longas
intermináveis
filas
de solidão.
Este é o tempo do homem exilado
nas ruas sem alma
de uma cidade estrangeira.
Ó solidão solidão
sombras e sombras na Via Appia.
Poderás ainda olhar as vinhas
nas encostas do Reno. Ou então beber cerveja
numa taberna velha de Estrasburgo.
Se tiveres sorte poderás ouvir
um canto muito belo
na Catedral de Metz.
E também o murmúrio do Trastevere
olhar a Piazza Navona
e pensar nos momentos altos
de Roma tão antiga.
Mas há um cronómetro no ritmo do teu sangue
e os teus sentidos já não sabem
o ciclo das estações.
Quem pode ainda povoar de azul
os pátios do olhar ?
Os bárbaros estão dentro da cidade
talvez até dentro de ti.
Não ouves o rumor ? É Roma a rastejar
nas auto-estradas da tristeza
ou talvez Átila que passa
com seus corcéis de sonho e de sucata.
E como esconjurar tantos presságios ?
Dizer por exemplo :Eis aqui
a nova ordem dos séculos.
Talvez um mensageiro chegue ao amanhecer.
E não sei ó Virgílio se o mel correrá
como orvalho do tronco dos carvalhos.
Talvez ainda o linho e a hortelã
talvez ainda o vinho
a velha mesa
uma branca ternura
um pouco
um pouco de beleza.