Marianne Moore, em vez de lápis,
emprega quando escreve
instrumento cortante :
bisturi, simples canivete.
Ela aprendeu que o lado claro
das coisas é o anverso
e por isso as disseca :
para ler textos mais corretos.
Com mão direta ela as penetra,
com lápis bisturi,
e com eles compõe,
de volta, o verso cicatriz.
E porque é limpa a cicatriz,
econômica, reta,
mais que o cirurgião
se admira a lâmina que opera.
Francis Ponge, outro cirurgião,
adota uma outra técnica :
gira-as nos dedos, gira
ao redor das coisas que opera.
Apalpa-as com todos os dez
mil dedos da linguagem :
não tem bisturi reto
mas um que se ramificasse.
Com ele envolve tanto a coisa
que quase a enovela
e quase, a enovelando,
se perde, enovelado nela.
E no instante em que até parece
que já não a penetra,
ele entra sem cortar :
saltou por descuidada fresta.