Ao senhor presidente
e chefe da nação
escrevo a presente
pra sua informação
recebi um postal
um papel militar
com ordem pra marchar
prà guerra colonial
diga aos seus generais
que eu não faço essa guerra
porque eu não vim à Terra
pra matar meus iguais
e aqui digo ao senhor
queira o senhor ou não
tomei a decisão
de ser um desertor
Desde que me conheço
já vi meu pai morrer
vi meus irmãos sofrer
vi meus filhos sem berço
minha mãe sofreu tanto
que me deixou sozinho
morreu devagarinho
nas dobras do seu pranto
já estive na prisão
sem razão me prenderam
sem razão me bateram
como se fosse um cão
amanhã de madrugada
pego numa sacola
e na minha viola
e meto-me à estrada
Irei sem descansar
pela terra lusitana
do Minho ao Guadiana
toda a gente avisar
à guerra dizei 'não!'
a gente negra sofre
e como nós é pobre
somos todos irmãos
e se quer continuar
a matar essa gente
vá o senhor presidente
tomar o meu lugar
se me mandar buscar
previna a sua guarda
que eu tenho uma espingarda
e que eu sei atirar.